Nesta obra o astrônomo americano Carl Sagan (1934 - 1996) apresenta o método científico e o posicionamento cético como os meios mais efetivos de que dispomos para conseguir alcançar algum entendimento verdadeiro sobre o mundo que o cerca. Sagan aponta os problemas da credulidade como um mal por si só ou uma forma de fomentar males maiores e mais deliberados e põe a ciência como uma pequena vela de inspiração e conhecimento em um mundo tragado nas trevas da ignorância mas que anseia por conhecimento. Sistematicamente, Sagan, aponta as falácias mais usadas por vertentes pseudocientíficas e mostra as verdadeiras ferramentas de uma mente cética contra idéias usurpadores e falsas verdades, argumentando contra atividades que visam deliberadamente explorar pessoas que anseiam pelo conhecimento do mundo mas que são constantemente traídas por obras escritas por pseudocientistas falaciosos e meios de comunicação que distorcem o que é dito. Ao leitor é dado a chance de compreender realmente o método científico e o pensamento cético, e como estas duas ferramentas, quando bem educadas e afiadas, podem servir como filtro que barra idéias falaciosas mas permite a entrada de inspiração e idéias bem fundamentadas, formando a base para a engenhosidade e elegância da ciência, enquanto atividade, e que nos permite extrair o conhecimento tão verdadeiro, sólido e consistente quanto se pode conseguir, em um diálogo com a natureza.
“É significativo que as abduções por extraterrestres ocorram principalmente no momento de dormir ou despertar, ou em compridos viagens em automóvel, quando existe o perigo bem conhecido de inundar-se em uma espécie de ensoñación hipnótica. Os terapeutas de abduzidos ficam perplexos quando seus pacientes contam que gritaram de terror enquanto seus cônjuges dormiam pesadamente a seu lado. Mas não é isso típico dos sonhos... que não se ouçam nossos gritos pedindo ajuda? Poderia ser que essas histórias tivessem algo que ver com o sonho e, como propôs Benjamim Simón para os Hill, fossem uma espécie de sonho? Um síndrome psicológico comum, embora insuficientemente conhecido, bastante parecido ao da abdução por extraterrestres se chama paralisia do sonho. Muita gente a experimenta. Ocorre neste mundo crepuscular a meio caminho entre estar totalmente acordado e totalmente dormido. Durante uns minutos, possivelmente mais, alguém fica imóvel e com uma ansiedade aguda. Sente um peso sobre o peito como se tivesse a alguém sentado ou tendido em cima. As palpitações do coração são rápidas, a respiração trabalhosa. podem-se experimentar alucinações auditivas ou visuais, de pessoas, demônios, fantasmas, animais ou pássaros. Na situação adequada, a experiência pode ter “toda a força e o impacto da realidade”, segundo Robert Baker, um psicólogo da Universidade de Kentucky. Às vezes, a alucinação tem um marcado componente sexual. Baker afirma que essas perturbações comuns do sonho são a base de muitos, se não a maioria, dos relatos de abdução de extraterrestres. (Ele e outros sugerem que há outras classes de declarações de abdução realizadas por indivíduos com tendência às fantasias, diz, ou às brincadeiras.) De modo similar, o Harvard Mental Health Letter (setembro de 1994) comenta: A paralisia do sonho pode durar vários minutos e às vezes vai acompanhada de vividas alucinações como de sonho que dão pé a histórias sobre visitas dos deuses, espíritos e criaturas extraterrestres.
PREFÁCIO
MEUS PROFESSORES
___________
Era um dia de tormenta no outono de 1939. Fora, nas ruas ao redor do edifício
de apartamentos, as folhas caíam e formavam pequenos redemoinhos, cada uma com
vida própria. Era agradável estar dentro de casa, a salvo e quente, enquanto minha
mãe preparava o jantar na cozinha ao lado. Em nosso apartamento não havia
meninos maiores que implicassem com os menores sem motivo. Precisamente, na
semana anterior me havia visto envolto em uma briga... não recordo, depois de
tantos anos, com quem; possivelmente fora com o Snoony Ágata, do terceiro piso...
e, depois de um violento golpe, meu punho atravessou o cristal da vitrine da
farmácia do Schechter.
O senhor Schechter se mostrou solícito: “Não se preocupe, tenho seguro”,
disse enquanto me lubrificava o pulso com um anti-séptico incrivelmente doloroso.
Minha mãe me levou a médico, que tinha a consulta na planta baixa de nosso bloco.
Com umas pinças extraiu um fragmento de vidro e, provido de agulha e linha,
aplicou-me dois pontos.
“Dois pontos!”, tinha repetido meu pai de noite. Sabia de pontos porque era
cortador na indústria da confecção; seu trabalho consistia em cortar com uma
temível serra elétrica moldes — as costas, por exemplo, ou mangas para casacos e
trajes de senhora— de um montão de tecido. Continuando, umas intermináveis
fileiras de mulheres sentadas diante de máquinas de costurar. Agradava-lhe que me
tivesse zangado tanto para vencer minha natural timidez.
Às vezes é bom devolver o golpe. Eu não tinha pensado exercer nenhuma
violência. Simplesmente ocorreu assim. Snoony me empurrou e, no momento
seguinte, meu punho atravessou a vitrine do senhor Schechter. Eu me tinha lesado a
pulso, tinha gerado um gasto médico inesperado, tinha quebrado uma vitrine de
vidro laminado e ninguém se zangou comigo. Quanto ao Snoony, estava mais
Tentei elucidar qual era a lição de tudo aquilo. Mas era muito mais agradável
tentar descobri-lo no calor do apartamento, olhando através da janela da sala a baía
de Nova Iorque, que me arriscar a um novo contratempo nas ruas.
Minha mãe se trocou de roupa e maquiado como estava acostumado a fazer
sempre antes que chegasse meu pai. Quase se tinha posto o sol e ficamos os dois
olhando além das águas enfurecidas.
—Ali fora há gente que luta, e se matam uns aos outros - disse fazendo um
sinal vago para o Atlântico. Eu olhei com atenção.
—Sei —respondi—. Os vejo.
—Não, não pode vê-los —repôs ela, quase com severidade, antes de voltar
para a cozinha—. Estão muito longe.
Como podia saber ela se eu os via ou não?, perguntei-me. Forçando a vista,
tinha-me parecido discernir uma fina franja de terra no horizonte sobre a que umas
pequenas figuras se empurravam, pegavam e brigavam com espadas como em meus
gibis. Mas possivelmente tivesse razão. Possivelmente se tratava só de minha
imaginação; como os monstros de meia-noite que, em ocasiões, ainda despertavam
de um sonho profundo, com o pijama empapado de suor e o coração palpitante.
Como se pode saber quando alguém só imagina? Fiquei contemplando as
águas cinzas até que se fez de noite e me mandaram a me lavar as mãos para jantar.
Para minha delícia, meu pai tomou em braços. Podia notar o frio do mundo exterior
contra sua barba de um dia.
---ooo---
Um domingo daquele mesmo ano, meu pai me tinha explicado com paciência
o papel do zero como ponto de origem em aritmética, os nomes de som malicioso
dos números grandes e que não existe o número maior (“Sempre pode acrescentar
mais um”, dizia). De repente me entrou uma compulsão infantil de escrever em
seqüência todos os números inteiros do um aos mil. Não tínhamos nenhuma
caderneta de papel, mas meu pai me ofereceu o montão de cartões cinzas que
guardava quando lhe traziam as camisas da lavanderia. Comecei o projeto com
entusiasmo, mas me surpreendeu quão lento era. Quando me encontrava ainda nas
centenas mais baixas, minha mãe anunciou que era a hora do banho. Fiquei
desconsolado. Tinha que chegar a mil. Interveio meu pai, que toda a vida atuou de
mediador: se me submetia ao banho sem pigarrear, ele continuaria a seqüência por
mim. Eu não cabia em mim de contente. Quando saí do banho já estava perto do
novecentos, e assim pude chegar a mil só um pouco depois da hora habitual de me
deitar. A magnitude dos números grandes nunca deixou de me impressionar.
Também em 1939, meus pais levaram-me a Feira Mundial de Nova Iorque. Ali
me ofereceu uma visão de um futuro perfeito que a ciência e a alta tecnologia tinham
feito possível. Tinham enterrado uma cápsula cheia de artefatos de nossa época, para
benefício de gente de um futuro longínquo... que, assombrosamente, possivelmente
não soubesse muito da gente de 1939. O “mundo do amanhã” seria impecável,
limpo, racionalizado e, por isso eu podia ver, sem rastro de gente pobre.
Veja o som”, ordenava de modo desconcertante um pôster. E, certamente,
quando o pequeno martelo golpeava o diapasão aparecia uma bela onda sinosoidal
na tela do osciloscopio. “Escute a luz”, exortava outro pôster. E, quando o flash
iluminou a célula fotoelétrica, pude escutar um pouco parecido às interferências de
nosso rádio Motorola quando o dial não dava com a emissora. Simplesmente, o
mundo encerrava uma série de maravilhas que nunca me tinha imaginado. Como
podia converter um tom em uma imagem e a luz em ruído?
Meus pais não eram cientistas. Não sabiam quase nada de ciência. Mas, ao me
introduzir simultaneamente no ceticismo e o assombroso, ensinaram-me os dois
modos de pensamento de tão difícil convivência e que são à base do método
científico. Sua situação econômica não superava em muito o nível de pobreza. Mas
quando anunciei que queria ser astrônomo recebi um apoio incondicional, apesar de
que eles (como eu) só tinham uma idéia rudimentar do que faz um astrônomo.
Nunca me sugeriram que talvez fosse mais oportuno que me tornasse médico ou
advogado.
Eu adoraria poder dizer que na escola elementar ou secundário tivera
professores de ciências que me inspiraram. Mas, por muito que mergulho em minha
memória, não encontro nenhum. Tratava-se de uma pura memorização da tabela
periódica dos elementos, alavancas e planos inclinados, a fotossíntese das plantas
verdes e a diferença entre a antracita e o carvão betuminoso, Mas não havia
nenhuma elevada sensação de maravilha, nenhuma indicação de uma perspectiva
evolutiva, nada sobre idéias errôneas que todo mundo tinha acreditado certas em
outra época. Supunha-se que nos cursos de laboratório do instituto devíamos
encontrar uma resposta. Se não era assim, suspendiam-nos. Não nos animava a
aprofundar em nossos próprios interesses, idéias ou enganos lhes conceitue. Ao final
do livro de texto havia material que parecia interessante, mas o ano escolar sempre
terminava antes de chegar a dito final. Era possível ver maravilhosos livros de
astronomia, por exemplo, nas bibliotecas, mas não na classe. Nos ensinava a divisão
larga como se tratasse de uma série de receitas de um livro de cozinha, sem
nenhuma explicação de como esta seqüência particular de divisões curtas,
multiplicações e subtrações dava a resposta correta. No instituto nos ensinava com
reverência a extração de raízes quadradas, como se tratasse de um método entregue
tempo atrás no monte Sinai. Nosso trabalho consistia meramente em recordar o que
nos tinha ordenado: consegue a resposta correta, não importa que entenda o que faz.
Em segundo curso tive um professor de álgebra muita capacitada que me permitiu
aprender muitas matemática, mas era um valentão que desfrutava fazendo chorar às
garotas. Em todos aqueles anos de escola mantive meu interesse pela ciência lendo
livros e revistas sobre realidade e ficção científica.
A universidade foi a realização de meus sonhos: encontrei professores que não
só entendiam a ciência mas também realmente eram capazes de explicá-la. Tive a
sorte de estudar em uma das grandes instituições do saber da época: a Universidade
de Chicago. Estudava física em um departamento que girava ao redor do Enrico
Fermi; descobri a verdadeira elegância matemática com o Subrahmanyan
Chandrasekhar; tive a oportunidade de falar de química com o Harold Urey; durante
os verões fui aprendiz de biologia com o H. J. Muller na Universidade de Indiana; e
aprendi astronomia planetária com o único praticante com plena dedicação da época,
G. P. Kuiper.
No Kuiper vi pela primeira vez o chamado cálculo sobre guardanapo de papel:
te ocorre uma possível solução a um problema, agarra um guardanapo de papel,
apela a seu conhecimento de física fundamental, rabisca umas quantas equações
aproximadas, substitui-as por valores numéricos prováveis e comprova se a resposta
pode resolver de algum modo seu problema. Se não ser assim, deve procurar uma
solução diferente. É uma maneira de ir eliminando disparates como se fossem capas
de uma cebola.
Na Universidade de Chicago também tive a sorte de me encontrar com um
programa de educação geral desenhado pelo Robert M. Hutchins no que a ciência se
apresentava como parte integral da maravilhosa tapeçaria do conhecimento humano.
considerava-se impensável que um aspirante a físico não conhecesse o Platón,
Aristóteles, Bach, Shakespeare, Gibbon, Malinowski e Freud... entre outros. Em
uma classe de introdução à ciência nos apresentou de modo tão irresistível o ponto
de vista do Tolomeo de que o Sol girava ao redor da Terra que muitos estudantes
tiveram que repensar sua confiança em Copérnico. A categoria dos professores no
programa do Hutchins não tinha quase nada que ver com a investigação; ao contrário
—a diferença do que é habitual nas universidades norte-americanas de hoje—,
valorava-se aos professores por sua maneira de ensinar, por sua capacidade de
transmitir informação e inspirar à futura geração.
Neste ambiente embriagador pude preencher algumas lacunas de minha
educação. Me esclareceram muitos aspectos que me tinham parecido profundamente
misteriosos, e não só na ciência. Também fui testemunha de primeira mão da alegria
que sentiam os que tinham o privilégio de descobrir algo sobre o funcionamento do
universo.
Sempre me hei sentido agradecido a meus mentores da década de 1950 e tenho
feito o possível para que todos eles conhecessem minha avaliação. Mas quando jogo
a vista atrás me parece que o mais essencial não o aprendi de meus professores de
escola, nem sequer de meus professores de universidade, mas sim de meus pais, que
não sabiam nada absolutamente de ciência, naquele ano tão longínquo de1939.
“A idéia da aplicação democrática do ceticismo é que todos deveriam ter as ferramentas essenciais para avaliar efetiva e construtivamente as alegações de quem se diz possuidor do conhecimento.” (pág. 87)
“Analfabetismo científico é o que faz com que a maioria dos americanos pense que os dinossauros conviveram com os seres humanos e só desapareceram no dilúvio porque não cabiam na arca de Noé.”
Sobre o livro Insônia e as alucinações (me permito chamá-las assim) de Ralph:
- “Parte dos motivos para as crianças terem medo do escuro pode ser o fato de que, até há bem pouco, em toda a nossa história evolutiva, elas nunca dormiam sozinhas. Em vez disso, aninhavam-se em segurança, protegidas por um adulto – em geral, a mamãe. No ocidente esclarecido, nós as enfiamos sozinhas num quarto escuro, damos boa-noite, e temos a dificuldade em compreender por que elas às vezes ficam perturbadas. Em termos de evolução da espécie, faz sentido que as crianças tenham fantasias com monstros assustadores. (...) Os que não têm medo de monstros tendem a não deixar descendentes”, afinal “num mundo povoado por leões e hienas, essas fantasias ajudavam a impedir que filhotes indefesos se aventurasses longe demais de seus guardiões” ( Pág. 117/18)
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“Analfabetismo científico é o que faz com que a maioria dos americanos pense que os dinossauros conviveram com os seres humanos e só desapareceram no dilúvio porque não cabiam na arca de Noé.”
“A ciência pode ter expulsado os fantasmas e as bruxas das nossas crenças, mas com igual rapidez preencheu o espaço vazio com alienígenas que desempenham as mesmas funções. Só os enfeites exteriores dos extra-terrestres são novos. Todo o medo e todos os dramas psicológicos de lidar com o problema parecem simplesmente ter encontrado mais uma vez o seu lugar, constituindo como sempre a atividade do reino das lendas, onde as coisas explodem à noite.” (Pág. 137- Thomas E. Bullard,
“Manter a mente aberta é uma virtude. Mas ela não deve ficar tão aberta a ponto do cérebro cair pra fora!”
folclorista)
“Quando é do conhecimento de todos que os deuses descem à Terra, nós talvez tenhamos alucinações com deuses; quando todos nós estamos familiarizados com demônios, aparecem os íncubus e súcubus; quando os duendes são aceitos por toda parte, vemos duendes; numa era de espiritualismo, encontramos espírito; e quando os antigos mitos se enfraquecem e começamos a pensar que os seres extra-terrestres são plausíveis, é para eles que tendem nossas imagens hipnagógicas.” (pág. 137)
O nosso medo é uma herança genética de nossos ancestrais primitivos, ao passo que a forma como expressamos tal medo é determinada sócio-culturalmente.
“É um erro capital teorizar antes de obter os dados. Insensivelmente, começa-se a distorcer os fatos para adaptá-los às teorias, em vez de fazer com que as teorias se adaptem aos fatos.” (Sherlock Holmes, em A Scandal in Bohemia, de Conan Doyle/1891)
“Se os alienígenas ao menos ficassem com todas essas pessoas que raptam, o nosso mundo seria um pouco mais sadio.”
“Manter a mente aberta é uma virtude. Mas ela não deve ficar tão aberta a ponto do cérebro cair pra fora!”
“Se os que 'curam pela fé' conseguem resultados semelhantes ao efeito placebo em casos de doenças psicogênicas – algumas dores nas costas e nos joelhos, dores de cabeça, gagueira, úlceras, estresse, febre de feno, asma, paralisia e cegueira histéricas, falsa gravidez(com interrupção das menstruações e inchaço abdominal [pág. 232])-, porque não deixá-,los em paz?
Simples. Toda vez que alguém procurar 'curar pela fé' uma doença orgânica (não-psicogênica) estará perdendo a oportunidade de ser realmente curado pela ciência. Por exemplo (pág. 231): Quando o baço de uma criança é partido, basta fazer uma simples cirurgia e a criança se recupera completamente. Mas se levarem a criança à alguém que 'cura pela fé', ela morre em um dia.
William Nolen, médico de Minessotta diz: “Quando os que curam [pela fé] tratam de doenças orgânicas graves, são responsáveis por incalculáveis angústias e infelicidade [...]. Os curandeiros transformam-se em assassinos.”